sábado, 1 de março de 2014

Estilistas na fase oral 7 : século XIX 3.0

Na vespassada acabei estendendo o post demais - como sempre - e ficamos só na música vocal de câmara, sem tempo para sequer começarmos a tratar da música vocal de teatro.  

Este vai ser mais um post inútil, pois não existe nada mais conhecido do que a ópera do século XIX. Excetuando Mozart, 99,99999% (sem exagero!) das óperas que ouvimos são desse período, desde as mais "populares" (como O Barbeiro de Sevilha, do Rossini), às mais "esotéricas" (como A Noiva Vendida, do Bedrich Smetana).

Vamos, então, tentar descobrir o que mais existe de música vocal de teatro além de ópera, já que todo mundo conhece tudo a esse respeito (ópera). E, quer saber? Não é que há um repertório de música vocal de teatro e que não é ópera? Poizé! Ah, aviso aos net-navegantes: este post, se você quiser ouvir todas as obras, vai render umas 20 horas de música. Estão avisados!

Começo, portanto, com um dos meus favoritos, o Robert Schumann, e seu oratório Das Paradies und die Peri, op. 50, baseado numa lenda da Índia. Aqui, só uma "palhinha" - o final:


Quem se aventurar a enfrentá-lo todo, cá está a versão integral, cujo libreto (no original alemão, e mais versões em francês e italiano) pode ser lido AQUI:


Um dos gêneros de música para teatro bastante comuns no período é aquele de música para teatro: música (vocal e/ou instrumental) para acompanhar apresentações teatrais, gênero conhecido como música incidental. Dois dos exemplos mais famosos são Rosamunde, D. 797, do Franz Schubert, para uma peça de Helmina von Chézy (famosa quem???), e Sonhos de Uma Noite de Verão, op. 61, do Felix Mendelssohn-Bartholdy, para a peça de Shakespeare (esse eu conheço!).

Ambas - assim como a música incidental para a peça Egmont, do Goethe, composta pelo Beetho - têm trechos vocais, apesar de que, em 99,999999% das apresentações e gravações, apenas os trechos instrumentais são executados, não me pergunte o porquê...

Esse é um gênero que praticamente morreu, infelizmente, e os exemplos que sobrevivem só conseguem fazê-lo aos pedaços. Sonhos... é um dos que melhor sobrevivem, pois TODO MUNDO conhece ao menos um de seus trechos, a mega-ultra-hiper-super famosa Marcha Nupcial:


Descobri uma versão integral, com TUDO!!!! Lindíssimo! Não sei por que quase nunca a apresentam na integral:

(Não encontrei o texto, saco...)

De Rosamunde geralmente só se ouve a abertura, assim como também só se ouve a abertura para o Egmont, que, alías, é linda:


Achei uma versão integral do Egmont, mas também sem texto:


L'Arlésienne, do Georges Bizet, música incidental para a peça de Alphonse Daudet (famoso quem???), sobreviveu apenas como suíte orquestral, e os trechos vocais (solistas e coro) desapareceram nas areias do tempo; nem no IúTúbi eu consegui descobrir uma versão integral. Terei que sair provisoriamente do assunto "música vocal" e  adicionar só o vídeo das 2 suítes que costumam ser apresentadas:


O século XIX era completamente fascinado por ópera e pela sinfonia, e estes dois gêneros dominam o repertório de música para teatro. Das cantatas e oratório seculares, das músicas incidentais para peças teatrais, pouco restou, como já vimos. A música vocal para teatro não-operística que melhor sobrevive é, estranhamente,  aquela mais difícil de classificar, habitando uma zona nebulosa entre a sinfonia, a ópera, e o oratório, como La Damnation de Faust, op. 24, do Hector Berlioz, sobre o Faust, do Goethe, composta para grande orquestra, solistas, grande coro, e mais coro infantil.

Geralmente La Damnation é apresentada em versão de concerto, mas também pode ser - e é - apresentada como ópera:


Outra obra sua que ainda sobrevive é a sinfonia coral Roméo et Juliette, op. 17, para coro e orquestra, que eu adoro!:

(Achei o libreto, para quem quiser, AQUI.)

Na mesma categoria - sinfonia coral - está a Sinfonia Fausto, S. 108, do Franz Liszt (ó o Fausto aqui de novo, gente!), para orquestra, tenor, e coro, onde cada um dos três movimentos é dedicado a um personagem: Fausto, Gretchen, e Mefistófeles. Eu também adoro!:


Aproveitando o fascínio que o século XIX tinha tanto por óperas quanto por canções de câmara, o meu amigo Berlioz resolveu orquestrar seu ciclo de canções Les Nuits d'Été, op. 7 (originalmente para piano e voz) e inaugurar mais um gênero - canções com orquestra (geralmente em ciclos) - transformando um evento simples e corriqueiro (canções para piano em voz) em grande espetáculo teatral. Essa transformação, na verdade, só vai dar seus melhores frutos a partir do final do século XIX, e a maioria dos exemplos que conheço, antes de 1880, são de versões orquestradas de "originais" para piano e voz. Não deixam de ser lindos, porém!

Les Nuits d'Été:

(Os poemas - original francês e outras versões - estão AQUI)

No "past post" eu me esqueci de incluir um dos meus ciclos de canções (para voz e piano) favoritos, o Wesendonck Lieder, do Richard Wagner. Lembrei-me dele agora pois sua última canção, "Träume", também foi orquestrada, pelo próprio Wagner:


A versão em inglês do original em alemão é esta:

Tell me, what kind of wondrous dreams
are embracing my senses,
that have not, like sea-foam,
vanished into desolate Nothingness?

Dreams, that with each passing hour,
each passing day, bloom fairer,
and with their heavenly tidings
roam blissfully through my heart!

Dreams which, like holy rays of light
sink into the soul,
there to paint an eternal image:
forgiving all, thinking of only One.

Dreams which, when the Spring sun
kisses the blossoms from the snow,
so that into unsuspected bliss
they greet the new day,

So that they grow, so that they bloom,
and dreaming, bestow their fragrance,
these dreams gently glow and fade on your breast,


and then sink into the grave.

Posteriormente várias versões orquestrais surgiram para o ciclo inteiro, por obra e graça de outros compositores, como a versão de Felix Mottl. Os vídeos para todas as 5 peças do ciclo estão neste link:


E os textos, em vários idiomas, estão AQUI.

Lindos! Lindos! Mas teremos que esperar até o final do século para encontrarmos ciclos de canções concebidas originalmente para orquestra e voz(es). Mas a espera valerá a pena, pois teremos, então, a chance de ouvirmos coisas espetaculares!

Para encerrarmos o assunto de hoje, vou ter que voltar atrás na minha decisão de não colocar nada de ópera neste post e de sempre tentar colocar coisas menos conhecidas, pois não resisti à tentação de incluir o final de Tristão e Isolda, do Wagner, que todo mundo conhece, claro. Mas vale a pena repetir a experiência:


Assustador de tão lindo!!!!!!

E uma versão (com a mesma cantora, Waltraud Meier) mais antiga, com os 15 minutos finais da ópera para contextualizar um pouquinho a história, também com legendas:


Adorei um dos comentários ao vídeo: "It is in these rare moments of time that I am really proud to be a human being."

E agora vou ter que sair correndo para assistir à ópera toda. Até a próxima, pessoal!

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