segunda-feira, 10 de março de 2014

A 2 é bom, mas a 3 é melhor ainda!

Depois de A 2 é bom!, que eu postei há séculos, já estava mais do que na hora de chamarmos mais um parceiro e experimentarmos algumas outras cositas más que podem "se assuceder" em qualquer câmara que se preze.

Não falarei de trios compostos antes do período Clássico porque, como todo mundo já viu aqui no blog, um trio não necessariamente era composto de 3 músicos... Podia ser 4, 5, 6, e apenas durante o Classicismo é que trio passa a significar, literalmente, 3.

Mesmo assim, como também já vimos por aqui, o trio clássico começou como 1+2 (piano + dois instrumentos quaisquer), onde os 2 só estão ali para alegrar o 1, para que ele não se sinta muito sozinho. O Trio em sol maior, Hob. XV/25, do meu grande amigo Joseph Haydn, porém, já merece o rótulo de "Trio de verdade":


Delicioso! O terceiro movimento parece um cachorro perseguindo o próprio rabo! Poderíamos passar o post inteiro ouvindo só Haydn. Só de trios tem mais de 40! Eu adoraria, mas temos que seguir com nossa jornada câmara adentro.

Não dá para pensar em Haydn sem automaticamente me lembrar de Mozart (eu e todo mundo, claro), mas não falarei dele, hoje, porque todo mundo já sabe que ele faz tudo direito (inclusive a 3). Também vou deixar o Beetho de fora, e partir para outros trios posteriores, pois já ouvimos um de seus trios em A 2 é bom! (um movimento só), e todo mundo conhece todos os restantes, claro... Não conhece? Não faz mal! Algum dias trataremos do Beetho num post exclusivo - talvez!

Um dos trios pós-Beethoven mais famosos é o Trio em mi bemol maior, para Violino, Violoncelo e Piano, Op. 100, D. 929, do Schubert. Todo mundo o conhece, e todo mundo gosta. Até os vampiros gostam dele, apesar de o Trio lhes ter sido apresentado numa versão muito reduzida, onde até a melodia é levemente simplificada, não me pergunte o porquê:


O movimento inteiro é esse aqui:


Todo mundo que gosta de música clássica conhece este Trio, mas, caso alguém tenha estado embaixo de alguma pedra quando o Schubert passou por perto, aqui está a obra completa:


Depois desse exemplo ficou difícil continuar com o assunto... Quase todos os outros trios, agora, vão parecer meio "nhém-nhém".


Pausa para tirarmos o Schubert das orelhas

Você sabia que a palavra trio, em música, pode designar outras coisas também? Não é nenhuma novidade, porém, já que tudo em música é uma bagunça. O nome trio pode ser dado - e é - ao trecho intercalado, por exemplo, entre as duas repetições de um minueto (entre outras danças). Ó só o Minueto e Trio em sol maior, WoO 10, nº 2, do Beetho:

(Tá bom, eu sei, eu acabei falando sobre o Beetho. Mas foi algo muito bobo; nem valeu...)

Ó só também o Scherzo e Trio, da Sonatina para Violino e Piano, Op. 100, do Dvorák: 


Ou o Scherzo e Trio, da Sonata nº 3, em dó maior, Op. 2, nº 3, do Beetho (ó ele de novo aqui!). E está certa a numeração, ok? Ela é a sonata nº 3 (da série de 32 sonatas do Beetho), e também é a peça nº 3 dentro do Opus nº 2; portanto, "nº 3, op. 2, nº 3":


Essas gravações não são lá grandes coisas, mas pelo menos servem ao propósito de mostrar trios que não são "Trios", e para esvaziarmos nossos ouvidos.

Fim da Pausa

Estamos agora prontos - espero - para voltarmos ao assunto de antes, e ouvirmos novamente o terceiro movimento do Trio do Schubert de lá de cima, caso alguém tenha deixado de notar que esse Trio também tem um trio em seu terceiro movimento (Scherzo e Trio). O Trio do Trio começa em 2:59 e vai até 5:22 (é... o Trio é maior que o Scherzo!):


Ufa... Chega de Schubert! 

Tá na hora de ouvirmos outro grande trio para violino, cello e piano, o Trio nº 1, em ré menor, Op. 49, do Mendelssohn. Por falar nisso, os trios para piano piano, cello e violino são conhecidos - obviamente - como trios com piano, para diferenciá-los de outras combinações de instrumentos. Se não for exatamente esta formação, eles terão nomes diferentes, como, por exemplo, Trio para Piano, Trompa e Violino, Trio para Cordas, Trio para Flauta, Clarineta e Fagote, etc, etc, etc. Trio com Piano refere-se sempre a piano+violoncelo+violino. Mas, voltando ao Mendelssohn: segurem-se às suas cadeiras, principalmente durante o primeiro movimento, pois dá uma vontade louca de sair correndo pela sala arrancando todos cabelos (inclusive os da cabeça!):


O Mendelssohn também tem o Trio com Piano nº 2, em dó menor, Op. 66, mas que não é tão espetacular quanto o primeiro, eu acho. Apesar disso, seu 1º movimento é maravilhoso! Tente prestar atenção na música e não no "Trio de cabelinhos iguais", que dá um pouco no meus nervos:


Caso você não tenha saído correndo ainda, vou dar lhe mais uma chance! Trio com Piano nº 4, em mi menor, Op. 90, "Dumky", do Dvorák, que, diferentemente da maioria dos Trios, tem 6 movimentos. E, olha só, é com um grupo lá de Curitiba!:


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Ainda está aí? Então vamos ouvir o Trio com Piano, em lá menor, do Ravel, numa ótima gravação:


Lindo!

Da mesma época (só que de quase 30 anos antes), temos o Trio com Piano, em sol maior, L. 3, do Debussy. Muito mais simples que o do Ravel, mas tem seu charme:


Num outro mundo, completamente diferente (geograficamente, inclusive), está o Trio com Piano do americano Charles Ives, mais ou menos da mesma época que o do Ravel que ouvimos há pouco. Apesar de sua relativa estranheza, é, em minha opinião, um grande Trio:


Outro grande Trio mais recente é o Trio com Piano nº 2, em mi menor, Op. 67, do Shostakovich. Tão melancólico, tão fantasmagórico, tão lindo:


Na categoria "estranho" também está Mozart: Adagio para Trio, do Arvo Pärt. Não é estranho com relação ao som, mas sim à concepção, pois é uma "versão" (Releitura? Adaptação? Deturpação? Sei lá, depende de quem ouve) do segundo movimento de um concerto para piano do Mozart:


Eu gosto bastante, confesso, e gosto mais a cada vez que o ouço novamente!

Para quem não conhece (e tem preguiça de procurar no IúTúbi), o Mozart é este aqui, o segundo movimento do Concerto para piano e orquestra nº 23, em lá maior, K. 488. Pode chorar que eu deixo!:


Outro ilustre desconhecido é o suíço (depois naturalizado americano) Ernest Bloch, que escreveu um Trio com Piano. Eu, porém, prefiro seus Três Noturnos para Trio:


Quer mais um desconhecido? Vamos, então, com um Trio recém saído do forno, o fantasmagórico (mais um para a coleção!) Trio com Piano nº 2, do argentino Maurico Kagel, de 2001:


Hoje teremos que ficar só no repertório piano+cello+violino, que, como já deu para notar, é imenso!, mesmo sem termos falados dos Trios de Brahms, Schumann, Tchaikovisky, Rachmaninoff, Chopin, etc, etc, etc. Terminemos, como temos terminado ultimamente, com música brasileira.

Edmundo Villani-Cortês, e suas Cinco Miniaturas Brasileiras. Existem versões diferentes para esta obra (para dueto; para quarteto; orquestra; quarteto com clarineta; quarteto com periquito, panela de pressão, zíper e buzina - exagero meu, claro, mas tá perto disso). Vamos ouvi-la, claro, na "encarnação do dia":


Não podemos deixar de fora o Villa-Lobos, claro! Ainda bem que encontrei, pelo menos, seu Trio com Piano nº 2, mas em pedaços, infelizmente:

1º movimento:


2º movimento:


3º movimento:


4º movimento:


É sempre um problema encontrar música clássica brasileira (em vídeo, em CDs, em partituras), mas vou tentar encontrar algo mais. Espere só um pouquinho!

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Ufa, encontrei o Trio do César Guerra-Peixe:


Também encontrei o Trio do Osvaldo Lacerda. Aqui vai o primeiro movimento:


E o segundo movimento:


O chato (eu!) acha que, se você tiver preguiça de ouví-lo, não vai fazer muita falta, pois a música, sinceramente, não me parece grandes coisas. Mas um pouco da culpa pode ser dos intérpretes: o segundo movimento, principalmente (na minha opinião), deveria ser bem mais rápido, mais "nervoso", menos "moinho de vento" e mais "pistão de motor", se é que dá para entender o que eu quero dizer!

Então chega por hoje, pois já estamos todos cansados. No próximo capítulo veremos (e ouviremos) Trios para outras combinações de instrumentos. Só para ficarmos com um gostinho de quero mais (espero que fique!), vamos ouvir o primeiro movimento do Trio para Piano, Violino e Trompa, Op. 40, em mi bemol maior, do Brahms. Só ele mesmo para conseguir fazer uma combinação dessas parecer tão natural:



Então tá, povo. Auf wiederhören!

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